




A DOBRA NO TEMPO,
DO TEMPO QUE DOBRA.
os olhos travam a matéria. me olham enquanto me ajeito por detrás da câmera. abertura desce, ajeito os dedos nos respectivos botões e roldanas, comprimo a câmera contra meu próprio nariz. respiração ofegante. clique. o tempo trava junto do frame. as ondas de cor começam a se metamorfosear em lembranças dentro do corpo da câmera ignorando o fato de que o tempo segue imóvel. silêncio total. giro a lente da câmera pra cena seguinte. abertura sobe, velocidade desdobra em centelhas enquanto volto a comprimir a câmera contra o nariz e disparo. clique sobre clique. as ondas já atadas eternamente no papel fotossensível recebem a segunda pancada de mais luz e mais cor. o lapso temporal entre a primeira imagem e a segunda dá conta de mais um desses buracos de minhoca perdidos na imensidão de redes neurais e sinapses na galáxia do crânio. foto sobre foto, num único fotograma, num único frame, unindo ação e reação, plano e contraplano, dente e sorriso, vida e existência. é bonita demais essa relação da dupla-exposição, uma cena-chão, que assenta as coisas, assenta as ideias e uma cena-ar, que suspende a compreensão das certezas vistas, duvida e faz duvidar de si e do olhar. esse balanço entre as duas pontas do lapso temporal é meu teor cinematográfico favorito na fotografia analógica. ouroboros do caralho, todo pintado de vermelho, branco e preto que nem uma coral verdadeira cheia de fome e ânsia por uma tragada de cigarro, pontas de um looping sem começo e sem fim, se desorientam e criam na aberração visual a chance de que todas as possibilidades da vida sejam realmente tocáveis. nossa eterna brincadeira de testar as vias da imensidão. entre um clique e outro, na esperança incansável de que o lapso temporal se desmonte no intervalo do pulso, sigo com a câmera comprimida no nariz, os dedos rodando perspectivas e uma fagulha de existência se concretizando entre ruídos, aberrações cromáticas e devaneios.

















gear still:
Nikon N65 | Nikkor 50mm | Nikkor 18-200mm[FOMAPAM 200]
DISCLAIMER:
A dupla-exposição é uma técnica que consiste em travar a última foto capturada pela câmera e reutilizar o mesmo frame para uma segunda foto (pode ser feito de modo manual ou eletrônico, como é o caso da Nikon N65).
No caso de câmeras mais atuais, ainda existe a possibilidade de "múltipas" exposições, quando essa opção não se restringe, somente, à duas fotos.
Dessa forma, a técnica é totalmente criada - e queimada - diretamente na película de filme, ainda dentro da câmera, não passando por qualquer edição ou pós-produção.
O Adobe Lightroom foi usado único e exclusivamente para correção e tratamento de cor.
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[ENG]
The eyes lock onto matter. They watch me as I adjust myself behind the camera. Aperture drops, I place my fingers on the respective buttons and dials, pressing the camera against my own nose. Breathless. Click. Time locks along with the frame. Waves of color begin to metamorphose into memories inside the body of the camera, ignoring the fact that time remains still. Total silence. I turn the camera lens to the next scene. Aperture rises, shutter speed unfolds into sparks as I press the camera against my nose once more and fire. Click upon click. The waves, now eternally bound to the photosensitive paper, take a second hit—more light, more color. The temporal lapse between the first image and the second accounts for yet another of those wormholes lost in the vastness of neural networks and synapses in the galaxy of the skull.
Photo upon photo, within a single frame, uniting action and reaction, shot and reverse shot, tooth and smile, life and existence. This double-exposure relationship is too beautiful—a ground-scene that settles things, settles ideas, and an air-scene that suspends the understanding of certainties seen, doubts, and makes one doubt both oneself and one's gaze. This balance between the two ends of the temporal lapse is my favorite cinematic essence in analog photography. A goddamn ouroboros, all painted red, white, and black like a true coral snake, hungry and eager for a drag of a cigarette—ends of a loop with no beginning and no end, disoriented, creating in visual aberration the possibility that all of life’s possibilities may truly be possible.
Our eternal game of testing the pathways of the vastness. Between one click and another, in the tireless hope that the temporal lapse will dismantle itself in the pulse’s interval, I go on—with the camera pressed against my nose, my fingers spinning perspectives, and a spark of existence materializing between noises, chromatic aberrations, and reveries.
DISCLAIMER:
Double exposure is a technique that consists of locking the last photo captured by the camera and reusing the same frame for a second shot (this can be done manually or electronically, as is the case with the Nikon N65).
In more modern cameras, there is still the possibility of "multiple" exposures, where this option is not limited to just two photos.
In this way, the technique is entirely created—and burned—directly onto the film strip, still inside the camera, without undergoing any editing or post-production.
Adobe Lightroom was used solely and exclusively for color correction and adjustment.